Em “O Guarani”, a literatura adquire a função de formadora da identidade  nacional, de redefinição do homem brasileiro, ainda carente de matriz  própria alimentadora de seu caráter cultural e social, cujos valores,  ainda atrelados ao país colonizador, eram agentes impedientes de uma  identidade nacional autônoma. É um romance de auto-afirmação brasileira,  que busca no índio e no português, nessa mistura de raças e povos com  espíritos guerreiros, valorosos e vencedores, o homem genuinamente  brasileiro. Pelo menos é essa a visão idealizada que o romance,  propositadamente, tenta transmitir. “O Guarani” é um romance histórico,  pois busca em relatos reais a respeito da natureza e do povo indígena, a  moldura onde se enquadram seus elementos míticos e ideológicos. A  gestação do caráter do homem nacional com valores próprios passaria, na  visão de Alencar, por essa mistura salutar do valoroso homem português  com o destemido indígena, delineando, assim, o caráter e a identidade  nacionais. Alencar valeu-se de relatos históricos de cronistas,  missionários e viajantes para dar vida ao cenário da história, mas  também para que o leitor da obra pudesse identificar como sendo  verdadeiros, ou próximos da verdade, aqueles personagens descritos no  livro, para que estes pudessem ser mais facilmente identificados como  sendo, de fato, parte de nossa história. O processo de consolidação da  imagem nacional deveria estar, então, fundamentado no processo  histórico. 
Dom Antônio é o homem português forte, que cultiva valores e princípios  éticos e morais cristãos, dotado de uma autoridade natural que o sangue  nobre português lhe confere, além de uma educação formal e sólida.  Peri, o indígena honrado, igualmente estruturado nos valores do seu  povo, leal aos seus princípios e costumes. Um nobre genuinamente  brasileiro. Esse é o desenho correto, tanto do índio quanto do  português, que Alencar quer que o leitor absorva. 
“O Guarani” é uma obra recheada de simbolismo, todos apontando na  direção do nascimento do Brasil. A realidade do índio do romance deu  vida a uma percepção diferente daquela que existia até então dos povos  chamados de primitivos no Brasil, que era a de que estes eram selvagens e  não civilizados. Como na obra aqui analisada, Alencar propõe a formação  de uma identidade nacional passando pela reedificação de um novo índio,  este deveria ser, necessariamente, de elevado conceito. Alencar  propôs-se a nobilitar o índio. E também devido a esta necessidade de  formação de uma identidade nacional é que Alencar apegou-se na verdade  histórica, a fim de dar veracidade e credibilidade a estes caracteres  fundamentais que serviriam de novo desenho da nação. Tal verdade  histórica foi extraída de fontes fidedignas e documentos autênticos, não  podendo, portanto, ser posta em dúvida. O novo brasileiro seria,  portanto, um ser de elevado grau de honra e grandeza, uma mistura de  povos de valores superiores, conferindo, assim, à nação, uma estima por  si mesmo que esta jamais havia experimentado. “O Guarani” não apenas  tentou resgatar as origens do país, como também redefinir o espírito de  seu povo, conferindo a este uma identidade própria e nobre. Tudo isso  muito conveniente para um orgulho nacional inexistente até então.
     Fonte
 
pelo certo
ResponderExcluirnum é
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